quarta-feira, julho 25, 2007

ENCONTRANDO A MALDIÇÃO

Um conto de Celly Borges
Meia-noite

Andreas corria por ruelas molhadas pela impetuosa chuva que caíra pouco mais cedo, e fazia com que todas as casas ao seu redor se parecessem com ruínas mal-assombradas. Sob a luz da lua, os longos e belos cabelos do rapaz, pareciam com uma cascata dourada que voavam de um lado para outro, sem um ritmo certo.

Tentava fugir de algo que desconhecia, mas temia muito.

Parou, exausto, em frente a uma casa de arquitetura muito antiga, rústica. Agora sabia, nada mais o estava perseguindo. Neste momento pode ter certeza de que o que vira, fora obra de sua imaginação.

Repentinamente, o céu voltou a se tornar um negro tão intenso. Negro assim como os olhos da criatura que imaginara – ou realmente vira, as informações estavam confusos em sua mente –, e negro como sentia a alma da mesma criatura.

O único modo de fugir daquela chuva torrencial, que a pouco recomeçara, era pedindo abrigo naquela velha mansão.

Andreas correu ate o abrigo da porta, tentando se proteger com as mãos da água que o encharcava por inteiro. Bateu com a aldrava na imensa porta de entrada, que tinha enormes letras talhadas na mais nobre madeira, talvez as iniciais do proprietário. Um tempo depois a porta, entre rangidos muito altos, começou a ser lentamente aberta. Ele entrou, procurando alguém, olhando para todos os lados, de uma forma rápida e amedrontada.

– O que o senhor deseja?

O rapaz levou um grande susto, não reparara no homem atrás da porta, um senhor muito alto e magro, com cabelos pretos, muito bem cuidados, penteados para trás, carregado de gel. Usava um terno bastante alinhado.

A voz daquele homem era grave e sombria.

– Eu preciso de algum lugar para esperar até que esta chuva passe. Acaso posso ficar por aqui, por este tempo?

O homem foi até Andreas, que estava assustado.

– Devo perguntar o meu patrão, senhor. Espere na sala, por favor, não demorarei com a resposta –, ele fez uma referência um tanto quanto exagerada, e retirou-se, subindo um grande lance de escadas.

Andreas foi até a sala. Uma enorme sala, que era toda decorada com objetos medievais. Das paredes pendiam espadas, lanças, brasões, tapeçarias e até mesmo um arco e flechas, tudo muito antigo. A casa toda era como um castelo.

Examinava todos objetos sobre lareira recém apagada, com curiosidade, quando o dono da casa entrou no aposento. Andreas o olhou rápido, e o viu com aqueles mesmos olhos negros. Respirou fundo. O coração acelerando mais a cada minuto que se passava sem aquele senhor dizer uma única palavra, apenas analisando Andreas.

– Então você pretende ficar aqui? – perguntou o senhor de cabelos brancos, vestido com um belo roupão de seda vermelha, segurando um charuto entre os dedos em uma das velhas mãos enrugadas e nodosas, continuava avaliando o rapaz.

Andreas concordou somente com um aceno de cabeça, mesmo sem ter certeza de que realmente desejava permanecer naquele estranho e sombrio lugar.

– Tudo bem, então – disse o velho. – Mas acredito que esta chuva não passará tão rápido – ele olhou por uma das grandes vidraças da sala, onde a água batia com incrível violência. – Então penso que deverá estender-se por aqui esta noite.

Andreas não gostou da idéia. Respirou fundo mais uma vez.

– Não teria apenas como eu chamar um táxi? – perguntou já procurando um aparelho telefônico em algum canto da sala. – Eu não desejo incomoda-lo...

– Aqui não há telefone – interrompeu o mordomo.

Andreas olhou-o rápido.

– James – chamou o dono da casa, parecendo irritado –, mostre a este jovem onde ficam os quartos de hóspedes.

“E por favor, dê o melhor de nossos aposentos ao cavalheiro, aqui”. Ele levou o charuto à boca, com aqueles olhinhos ainda fitando Andreas.

James, o mordomo, levou Andreas por corredores imensos e também muito escuros, que eram iluminados apenas por alguns poucos archotes que pendiam das paredes, fazendo com que as sombras improvisassem uma terrível dança.

Andreas sentia muito medo.

– Aqui será, por esta noite, seu quarto, senhor. E, se acaso precisar de algo, não hesite em chamar-me – o mordomo foi se retirando com outra reverência exagerada, Andreas esperou até que ele sumisse por entre as sombras do mesmo lugar por onde vieram.

Aquele quarto era tão mal iluminado quanto o corredor. Andreas entrou e fechou a porta exatamente quando um raio cortou o céu lá fora, clareando todo o aposento, notava-se agora a decoração antiga, no mesmo estilo ao restante da casa. O coração do rapaz disparou.

Ele começou a sentir algo muito forte, ruim. Não entendia direito. Parecia que sua cabeça estava prestes a explodir, a apertou entre as mãos. Estava tendo um pressentimento estranhíssimo.

Andreas caiu no chão.

Alguns minutos mais tarde, ele corria por aqueles compridos corredores de luzes bruxuleantes, se chocando várias vezes contra as paredes, tentando achar a saída.

Encontrou a grande sala. E lá estava o dono da casa, em pé, com um olhar sombrio, parado ao lado da lareira, que agora estava acesa, e esta era a única fonte de luz do cômodo. Andreas o olhou sentindo medo. Respirou profundamente mais uma vez.

Um tempo depois, James entrou na sala, carregando uma bandeja com um bule e uma xícara de prata. Andreas estava no chão, caído, em meio a uma pequena poça de sangue.

O mordomo ficou pálido e imóvel por um instante, derrubou a bandeja, pulou para cima de Andreas, que revidou, fincando suas enormes e brancas presas no pescoço de James, assim como fizera com o dono da casa.

Andreas agora corria pelas ruas molhadas pela chuva que caíra mais cedo, tentando se livrar daquela maldição.


2 comentários:

  1. Arrebentou maninha!!! Ah e volte sempre ao blog, traga mais desses belos contos. Abração!

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  2. Voltarei, sim, maninho, obrigada! bjinhos!

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