quarta-feira, janeiro 30, 2008

Irmãos Nunca se Esqueçam do Nosso Blog

Sei que aprece pouco essa página aqui, mas ela tem muito valor sentimental a Irmandade das Sombras, então aos irmãos que passarem por aqui, lembrem-se nunca se esqueçam desse humilde blog, fundado no começo de nosso grupo por mim e pelo Roger. Não se esqueçam também de mandar textos afim de enriquecer esse espaço!

Aos visitantes um abraço também, vocês são muito impotantes para que continuemos a jornada. Nunca deixem de comentar e assinar nosso livro de visitas, pois só assim teremos incentivo e coragem para seguir adiante

E se você tiver um texto (Irmão ou não), que saber sobre a Irmandade (ou quer se juntar ao nosso grupo literário das sombras), pode mandar um e-mail para lhf_87@hotmail.com


Linx

A Ilha

Um conto do escritor e irmão Marcio, estreando hoje no blog

Por Marcio Bordin

Diego acorda com o corpo todo suado.
- Que pesadelo terrível- ele pensa em voz alta.
Quando vai se levantar, percebe que estranhamente estava dormindo em uma rede velha, suas roupas estão um trapo, todo roto; olha para os lados, seu quarto?!? Não está mais em seu quarto, ele acordou dentro de uma choupana aparentemente abandonada; teias de aranha por todos os lados; vasos de argila quebrados, poeira e mais poeira.
Está fazendo um calor de rachar, Diego procura por água, sua cabeça gira confusa, tenta entender o que está acontecendo, como que ele foi parar ali, nada faz sentido.
Olha em um canto da choupana, um vaso inteiro, talvez esse tenha água; sua garganta está em chamas; Diego pega-o e chacoalha, sim, tem algo líquido aqui, mas o cheiro está horrível; joga um pouco no chão de areia para conferir o que tem dentro, é um liquido grosso, vermelho escuro, fedorento... É sangue, junto com o sangue cai do interior do vaso algo meio redondo, de inicio não dá para ver direito o que é; Diego pega um galho e limpa o sangue e a areia que grudou na estranha bola ao cair... Meu Deus! É um olho humano.
Apavorado, o rapaz deixa o vaso cair, derramando todo o sangue sujo de dentro e vários olhos humanos; lembra-se de sua mulher e seus filhos; os procura desesperadamente; corre pra fora da choupana; o céu parece em chamas, sente como se sua pele pegasse fogo, seus pés descalços pisam em uma areia fervente como lava, seus joelhos dobram, ele chora, precisa ficar em pé, rastejando Diego continua procurando por sua esposa e seus três filhos; ao longe ele avista algumas árvores, talvez eles estejam em baixo de suas sombras se escondendo desse sol escaldante.
Mas Diego procura, grita pelos nomes e não ouve resposta; tudo levava a crer que ele estava só e pelo jeito estava no inferno. Diego se senta encostando-se ao pé de uma das enormes árvores, tentando se lembrar dos últimos acontecimentos que ocorreram no dia anterior, antes de se deitar para dormir em seu quarto ao lado de sua esposa; lembrou-se que estava em uma festa havaiana, bebeu muito, dançou com algumas dançarinas contratadas para animar a festa, elas até juravam de pés juntos serem mesmo havaianas, se fosse uma festa do dia das bruxas, elas jurariam ter 300 anos cada; lembrou também de ter discutido com sua esposa por causa dessas dançarinas, foi um pouco mais além de uma discussão, ela lhe deu um tapa e Diego lhe retribuiu o carinho; um garçom que também estava vestido de havaiano entrou na briga para acalmar as coisas, mas foi agredido por Diego com um soco no queixo; o agressor foi seguro pelos seguranças da festa, e o pobre garçom pegou sua bandeja do chão, olhou nos olhos de Diego e sussurrou algumas palavras desconhecidas por ele:
- Libo gabi sa ang impiyerno.
- Só pode estar me ofendendo- Diego pensou no momento, mas agora, em sua lembrança, as palavras do garçom estão tendo sentido:
– “Mil noites no inferno”. Foi isso que aquele maldito disse; será que estou no inferno? Só pode ser isso; esse calor, o céu, essa sede e nenhuma água...
Diego, com todo seu tormento, não tinha antes prestado atenção no som que vinha de suas costas, é o som do mar, ele se levanta e corre, saindo de baixo da sombra das arvores e voltando ao sol em chamas, pisando nas areias que lhe queimavam a sola dos pés deixando em carne viva, mas ele corria quase que se rastejando em direção à aquele som...
Enfim, seus olhos vêem ao longe, é mesmo o mar, mas conforme ia se aproximando, esse mar se tornava vermelho, é só o reflexo desse céu estranho e castigador; como se carregasse o mundo nas costas, sentindo toda a força da natureza empurrando seu corpo ao solo, ele resiste e, chega à margem das águas do mar; não é o reflexo do céu que a deixou vermelha, é um mar de sangue... Diego cai de joelhos, lágrimas escorrem de seu olhos, de braços abertos, ele olha para o céu e aos berros repete a pergunta que não quer se calar em sua cabeça:
- Por quê??? Diz-me o por quê???
Nada, nenhuma resposta; ele se levanta, tentando manter o corpo ereto, olha para todos os lados e onde seus olhos alcançavam só existia aquela areia cercada por sangue, de repente ele nota algo se movendo em baixo daquele liquido rubro, parece que são pessoas lhe acenando, fixa a vista já cansada e distorcida pelo sol, as imagens começam a ganham uma forma...
- Meu Deus o que é isso?
São pessoas presas pelo pé ao fundo desse mórbido oceano, porém elas estão vivas, acenando com as mãos para Diego, mas não parecem pedir por ajuda e sim o estão chamando; Diego olha diretamente no rosto de algumas dessas pessoas, algumas parecem sofrer, outras estão rindo, felizes.
- Será que a dor deles é menor que a minha? - Ele se questiona.
Dá alguns passos em direção ao mar de sangue, ele quer se juntar à elas, quer parar de sofrer, estão lhe chamando e suas pernas querem obedecer ao chamado, mas ele reluta, lembra-se que debaixo das árvores o sol não lhe castigava tanto, a sede ainda lhe ardia a garganta, porém nesse momento esse era o menor de seus males.
Longos minutos de caminhada que pareciam horas, Diego retorna a sombra das arvores, senta-se ao pé de uma delas novamente, chorando, seus olhos inchados se viram para o alto, nos galhos, quatro corpos dependurados, enforcados, corpos sem os olhos, os corpos de sua mulher e de seus três filhos...
-Nããããooo!!!
Ele grita em desespero, seu grito é ouvido pela enfermeira do manicômio, ela adentra ao quarto correndo acompanhada de outros dois enormes enfermeiros que o seguram enquanto ela lhe aplica uma injeção no braço. Diego sente seu corpo pesado, pouco à pouco o sono vai lhe tomando por completo, mas consegue ouvir a voz daquela enfermeira comentar com os outros dois rapazes:
- Ele assassinou a mulher e os filhos, foi algo brutal, arrancou os olhos de toda a sua família enquanto vivos e depois os enforcou...
Diego acorda com o corpo todo suado.
- Que pesadelo terrível- ele pensa em voz alta.
Quando vai se levantar, percebe que estranhamente estava dormindo em uma rede velha, suas roupas estão um trapo...

Eis que Chamei o Escuro para Testemunhar meu Renascimento

Esse conto foi escrito pelo amigo Cayus (C.M.poco.) continuando a obra de Henry. Um conto primoroso, vale a pena le-lo!

Por C.M.poco.

ESTA É UMA HOMENAGEM A MEUS MAIS NOVOS AMIGOS QUE ME INSPIRAM, ME INCENTIVAM E PRINCIPALMENTE ME ACEITAM COMO SOU E O QUE SOU.


" Im Reich Der Farbtöne agora entraremos, e não mais dele sairemos. Escolhestes vós, ó mortais, viver segundo o conselho dos fantásticos. Arcai agora com o peso dos segredos obscuros. Saboreai seu amargo deleite nas incomensuráveis trevas. Chamo agora diante dos que me invocaram o primeiro manuscrito da nova era."
Tais eram as palavras da criatura que Richmond, outrora incrédulo, agora tremia diante da situação tão singular em que se encontrava. Harmony nunca tivera dúvidas quanto ao sucesso de sua missão, mas agora vendo as consequências de tal sacrilégio refletia se realmente havia tomado a decisão correta. Para todos os efeitos, era tarde demais.
"Porunactum, ocsianort. Redrum invicti rinu
Mene, mene, taquel ri parsim.
Sent vás todunarum!
Coruegai atod redrum"

Aquela voz era diferente de qualquer outro som conhecido pelos homens. Toda a multidão observava atentamente cada gesto e movimentação do ser, enquanto este pronunciava palavras que só poderiam proceder dos rituais mais macabros da face da Terra. Mesmo entre todos os feiticeiros, bruxos e magos que se encontravam ali presentes, ninguém era capaz de traduzir sequer uma sílaba dos conjuros sentenciados pela irmandade. Harmony não podia sequer falar, tantas as emoções que seu corpo provava naqueles instantes que pareciam eternos.
De repente, o céu começou a escurecer violentamente. A noite de lua cheia deu lugar ao negrume das nuvens que cobriam todos os arredores do castelo. Aquela cena de horror se estendia até onde os olhos humanos podiam enxergar. Um vento forte ecoava nas árvores ao redor produzindo uma marcha fúnebre infernal, anunciando o caos que estava por vir. O povo começava a ficar agitado. A irmandade estava calada e apenas observava a sequência de fatos desencadeados por seu canto diabólico. Naquele corpo disforme via-se uma expressão de satisfação, que levemente lembrava um sorriso.
" Meu senhor, meu senhor. O que fizeste! Tal fizemos para despertar-te de teu sono e agora com que nos retribui?"
Richmond falava com imenso temor na voz, demonstrando o sentimento mútuo de todos ali presentes. Só mesmo Harmony conseguia manter-se em total estado de tranquilidade, como se aquela cena fosse a coisa mais natural por ele presenciada. Tidas as circunstâncias, qualquer um diria que ele também não era humano.
" Cala-te um instante mais, mortal. Não temas por tua vida insignificante e aguarda o que há de ser. Acaso não queríeis vós as trevas sobre a Terra? Eis que chamei o escuro para testemunhar meu renascimento. E para este novo reino, é necessário que todos meus companheiros estejam presentes!"
As palavras da irmandade vieram como uma bala arrojada sobre os pensamentos insólitos de Harmony. Estaria realmente o ser fazendo o que ele imaginava? Acaso fosse, coisas por demais tremendas adviriam. E sua árdua busca estaria próxima do fim.
A boca da criatura uma vez mais se abriu:

" Despertum , tucâmicon. Saracbás diamiratur.
Vedic, tosbash mavitramon.
Me servistes bem. Através de teu conhecimento permaneci.
Surge também mais uma vez, para que minha palavra
Se cumpra hoje aqui! "

Richmond punha-se de joelhos, demasiadamente atônito ao que contemplava. Um raio de fogo cruzava os céus, clareando aquela imensa escuridão. Distante avistava-se um objeto cortando o espaço com velocidade. Quem ainda permanecia descrente pôde atestar a verdade á luz de todos os fatos. Uma carruagem dourada guiada por dois alazões negros de patas incandescentes sobrepujava os ares da magnífica noite. Algo incomensurável para se expor totalmente em simples versos humanos!
Dentro do compartimento parecia constar uma espécie de caixão encrustado em ouro e pedras preciosas cintilantes ao reflexo daquela intensa luz. Toda a carruagem vinha ornamentada de crânios e ossos banhados numa espécie de verniz arroxeado que derramava espessas gotas por onde passava, deixando um odor nauseabundo e característico de sangue. Os olhos dos cavalos estavam vazados. Em seu lugar só restavam duas imensas cavidades, tão profundas que refletiam as almas dos homens que ousavam sondar demais todo aquele quadro de horror e beleza caótica. Harmony agora não podia se conter de tanta euforia. Tinha razão!
" É Lord Március, só pode ser. Então os escritos estavam corretos. Os últimos cavalheiros perdidos da irmandade surgem novamente!"
Logo que a carruagem atravessou as ruínas, houve um imenso estrondo e ela sumiu tão misteriosamente quanto apareceu. O objeto que se encontrava em seu interior caiu pesadamente sobre o castelo, vindo parar próximo da irmandade que aguardava ansiosa o aparecimento do senhor da noite: Lord Marcius Renatus Bordin.
A tampa do recipiente foi arremessada há muitos metros pelo ente que o habitava adormecido há tantos séculos, aguardando também sua hora de despertar. Levantando-se e olhando ao seu redor viu que muito tempo havia se passado desde que fizera o ritual de repouso da irmandade, unindo os membros decepados de seus componentes e escondendo o corpo remontado ali, no lar que tantas vezes havia visitado. Agora estavam juntos de novo. Prontos para recomeçar suas aventuras e contar suas histórias.
" Que bom que vós sois seres de palavra, amigos. Não fosse assim ainda estaria hibernando em meu sepulcro tantos séculos mais aguardando a sorte porventura me reerguer das entranhas da Terra. Vejo que aprendestes bem os rituais que vos ensinei. Vim tão logo ouvi vossa majestosa voz que há décadas não ouvia. E quem são todos estes mortais que nos olham com olhos tão sobremodo espantados?"
Sua voz, diferente da irmandade, era aveludada e sedutora. Num tom propício para dissuadir reis e enganar os doutos. Um caçador exímio da noite pronto a seduzir tantas donzelas quanto quisesse.
" Não te esqueças, caro amigo, que foi tua sabedoria o instrumento de nossa sobrevivência. Não fosse assim nossos ensinamentos teriam morrido. Eis aí nossos novos servos, sedentos do conhecimento sombrio que só nossas palavras podem dar. Toma agora tua pena, prepara teu pergaminho para que começemos a redigir nossa nova história, Marcius."
A irmandade estava ansiosa por compartilhar com tantos ouvintes tudo o quanto tinha ainda a dizer.
Marcius usava um belo sobretudo negro, semelhante aos trajes que os antigos celtas utilizavam em seus sacrifícios humanos. Sua aparência era jovial e trazia no rosto um semblante enigmático, típico das criaturas de sua espécie. Era dotado de muitos atributos, e no momento se utilizava da leitura mental a fim de prescrutar os intentos do senhor que o observava tão atentamente. Travava-se ali um intenso conflito psicológico, disputado lado a lado por oponentes de igual valor. Harmony analisava-o com ironia.
" Por que te escondes, Lord Cayus, por detrás desta casca humana? Revela logo a todos quem és, ou desejas que o faça eu mesmo?"
As mãos de Marcius se fecharam instintivamente.
" Nada temas, Senhor do escuro. Já que de tudo o sabes, não mais fugirei da realidade. Permita me apresentar, ó Irmandade viva e caro sr. Lord Marcius. Me chamo Cayus Marcws Pocotirios, seu criado. Mas podeis me chamar de C.M.poco. Tudo isto fiz, amigos, para que pudesse encontrar a vós, já que há tantos anos sumistes. Mas agora estão todos novamente aqui. Resolverei minhas pendências convosco e tudo entenderás."
Os olhos da Irmandade cerraram-se grosseiramente, demonstrando uma indignação mistificada á cólera desencadeada por aqueles últimos fatos. Seu corpo descomunal caminhou alguns passos em direção de Harmony, agora chamado de Cayus Marcws pocotirios. Este por sua vez resignou-se em erguer suas mãos em sinal de paz.
" Como ousas ludibriar todos aqui presentes com tuas mentiras, ó insolente ser! Primeiro dizes ser quem não é. Depois usas a mim, a Irmandade viva, para teus propósitos egoístas. Acaso não temes o mal que te sobrevirá? "
Cayus pediu silêncio por um momento e estendeu seu braço a Richmond que se encontrava prostado ao chão, pedindo que nada temesse também. Este mal podia se por de pé, tamanha era a falta de forças que apresentava seu débil corpo, completamente esgotado pelos acontecimentos tão aterradores naquele local.
" Queiras me perdoar irmandade, ó detentora das palavras etéreas. Mas foi a forma que encontrei para reunir meus aclamados mestres. Tanto vós como Lord Marcius tem parte em minha existência amaldiçoada. Nos tempos de suas publicações em vida, a irmandade foi meu espelho, meu guia nos caminhos do mal. Com o aprofundamento em seus escritos cheguei a conhecer o trabalho de Lord Marcius também e me iniciei no vampirismo vivido por ele. Mas diferente de seu processo tão bem sucedido de eternidade, acabei caindo numa tortuosa desgraça. Fui impelido pelo destino a me consumir dia a dia ardendo em desejo de ler seus contos. Sorver novamente daquelas delícias literárias que contagiavam minha condenada alma. Infelizmente fui frustado em minhas perspectivas. Dado que todos desapareceram antes que eu pudesse conhecê-los, passei a estudar ainda mais vossas obras em busca de uma forma de trazê-los á vida. Algo talvez subliminarmente lançado em seus manuscritos a favor deste propósito. Graças ás forças do medo e da perdição que estamos aqui hoje, reunidos. Mas uma pergunta ainda bate em meu coração, caro Marcius. E talvez seja a maior de minhas dores. Conte-me o fim de tua história. Teu último conto inacabado que se refere ao futuro da irmandade e aos sombriáticos. Como sobreviveram tanto tempo na imortalidade?
A irmandade viva e Lord Marcius se entreolharam no mesmo instante, filosofando mecânicamente a única resposta possível e cabida somente a eles de dar. Tudo esclarecia-se novamente, e o coro foi uníssono:
" Está nosso futuro nas mãos dos discípulos, caro Cayus. Sempre esteve e permanecerá para sempre nas mãos dos que perpetuam nossos ensinamentos. Enquanto esta multidão que vês diante de ti nos ler seremos lembrados. Só aí continuaremos existindo."


Im Reich Der Farbtöne - NO REINO DAS SOMBRAS






ESTA OBRA É UMA CONTINUAÇÃO DO CONTO DE HENRY EVARISTO, EM HOMENAGEM AO ANIVERSÁRIO DE UM ANO DA IRMANDADE DAS SOMBRAS C.M.poco.

O Último Cavaleiro das Trevas

Com muita honra posto hoje o conto de Henry Evaristo em homenagem a Irmandade

Por Henry Evaristo

(Conto comemorativo ao primeiro aniversário da Irmandade das Sombras)

Richmond não acreditava na possibilidade de que o morto pudesse retornar mas Harmony fora enfático: Ele retornaria após a leitura correta do “Im Reich Der Farbtöne”(1). Os dois estavam em uma das inúmeras salas escuras do castelo gótico do barão Von Sorian, na Moldávia. Ele havia sido o ultimo representante da Irmandade das Sombras e desaparecera misteriosamente no ano de 2057. Agora Richmond e Harmony haviam localizado o local incrustado em meio às inóspitas e solitárias montanhas dos Cárpatos. Sem sombra de dúvidas aquele havia sido o lugar de reuniões do grupo de literatos mais perturbador de toda a história da literatura universal; produtores de obras que aterrorizaram o mundo e foram capazes de transformar o senso de horror a níveis globais. Houve muita perseguição à concepção artística da Irmandade; governos americanos e europeus tentaram a todo custo banir suas publicações mas o povo insistia em ler cada um dos novos trabalhos de seus membros. Foram os discursos públicos e campanhas publicitárias cada vez mais agressivas, promovidas pelos governos dos países mais conservadores, que fizeram com que o grupo buscasse o isolamento nas montanhas. Um local escondido dos olhos de todos onde eles poderiam buscar inspiração e concentração total. E foi então que seus temas e suas produções encontraram um nível jamais imaginado nos anais das concepções de arte sombria. As publicações continuaram de forma clandestina, mas, ainda assim, chegando frequentemente ao alcance de seus leitores nas mais diversas linguas. E houve quem afirmasse, em lugares tão diversos do mundo quanto a África e a Suíça, que a leitura das obras dos escritores era prejudicial à saúde física e mental de quem lia. Richmond e Harmony, a duras penas e depois de vinte anos, obtiveram autorização do governo local para explorarem as ruínas do velho castelo. Foi entre as inúmeras salas, e em meio a extensas e mofadas estantes de livros, que eles encontraram a passagem para a sala secreta da Irmandade, conhecida como “A câmara dos Tormentos”; porém, daquele lugar escuro e úmido saíram durante o tempo em que os escritores ali permaneceram apenas os mais puros deleites sombrios que um leitor jamais sonhou em desfrutar. Não causavam tormentos ao corpo como queriam crer os puritanos do mundo. E na mente, o único mal que originaram talvez tenha sido a libertação dos afetados deste mundo apenas material oferecendo-lhes mergulhos profundos em vastos e encantados universos etéreos. O que Richmond e Harmony queriam era encontrar o lendário corpo insepulto do ultimo representante do movimento. Os outros, todos eles, havia sido descobertos em ruínas abandonadas ao redor do mundo sempre mutilados de forma bastante sistemática. Os dois pesquisadores do insólito encontravam razões para crer que as partes extraídas dos cadáveres estariam naquele local, junto ao corpo do barão Von Sorian. Estes motivos eles cooptavam das leituras e da interpretação da obra máxima da Irmandade, o terrível livro escrito em conjunto por todo o grupo, “Im Reich Der Farbtöne”. Segundo o compêndio seria possível, através da execução de determinados rituais, manter eternamente acesa a chama da imaginação obscura do grupo. Mas, lendo atentamente, e de posse das traduções dos trechos escritos em aramaico, se poderia encontrar “um livro dentro do livro” e este era muito mais terrível. Harmony o lera, e seus cabelos haviam embranquecido do dia para a noite. Para Richmond, sempre menos curioso que o amigo, aquela era a suma confirmação de que o material era sim danoso ao corpo e a alma; todavia, como fã incondicional da obra da Irmandade, nunca se opôs em seguir o outro em sua empreitada. Os rastros do barão haviam sido seguidos desde sua fonte original, no nordeste brasileiro, sendo elaborada uma detalhada reconstituição de sua trajetória entre a cidade de Salvador e as montanhas dos Cárpatos. Ele adquirira o castelo através do investimento de recursos próprios, muito provavelmente originários de espólios de família. Depois agrupara os irmãos em Londres e de lá partiram para sua ultima morada terrestre. Depois disso, não se sabe como, seus livros de contos, romances e novelas terríficas apareciam nas bancas e livrarias sempre sem que nenhum funcionário desse conta de sua encomenda e compra. Depois que as atividades cessaram, e os primeiros corpos mutilados foram surgindo, o ultimo livro apareceu numa biblioteca de Amsterdam. Foi lá que Peer Harmony o viu pela primeira vez. Nele descobriu, lendo as entrelinhas, um plano sinistro. Sua casa, nos subúrbios, era repleta de livros de terror e ocultismo. Juntando informações de inúmeras fontes ele entendeu o propósito da obra e assumiu para si a missão implícita ao descobridor. Foi apenas um dia antes de chamar a sua casa o amigo Albertus Richmond que ele terminou a tradução da ultima parte do rito principal. Era uma cerimônia de ressurreição. E dizia que seria dado o poder de dar continuidade à obra da Irmandade das Sombras àquele que, encontrando o cadáver do ultimo cavaleiro das trevas, o reerguesse da morte. As páginas finais do grimório continham todo o planejamento e prática da missa a ser realizada. No dia 06/06/2076, dezenove anos depois do desaparecimento da Irmandade das sombras, Richmond e Harmony estavam no interior do castelo abandonado para trazê-la de volta. Não havia o que questionar: O corpo encarquilhado e escuro que jazia em uma pedra de frio mármore negro era de fato o do barão Von Sorian; Porém, ele não era de forma nenhuma apenas isso. Seus membros não eram apenas aqueles com os quais viera ao mundo originalmente; eles estavam misturados, com costuras grossas e malfeitas, aos pedaços retirados dos cadáveres dos outros irmãos das sombras. Suas pernas não eram apenas suas pernas; eram também as de Lord Linx e Lord Henry. Seus olhos não eram apenas os seus olhos, mas também os de Lady Celly e Lady Hell. Todo o seu corpo era um imenso retalho, tal qual um Frankenstein ainda mais horrendo, que agregava as partes de todos os outros membros. Viam-se aqui partes das mãos de Lord Roger Silver misturadas com as unhas de Sir Luciano Barreto e os dedos de lady Mauren Müller; ali, a pele de Lady Catherine costurada aos cabelos de Sir Luiz Poleto e Dom Alexandre Nunes. Via-se na abominação híbrida, um rosto magnânimo: Numa metade era o do próprio Barão; na outra, o da condessa Victoria Magna. A visão estarrecedora derrubou o livro das mãos de Richmond à primeira vez que ele a avistara de sob a cortina de poeira que se erguera quando a passagem por trás da estante fora aberta. Depois, como ocorre com um odor nefando, ele acostumou-se e não mais sentiu os nervos abalados. Ou curara-se ou não tinha mais nervos. De qualquer forma tinha que se controlar; os planos de Harmony iam muito mais além. Foi numa sexta-feira que o ritual foi realizado. Uma descrição detalhada de todo o ocorrido seria deveras traumática para o leitor. Opto por partir do ponto em que tudo se tornou tão palpável quanto as pedras das paredes bolorentas do castelo Von Sorian. Tudo o que era necessário à manobra mágica se encontrava na própria câmara secreta. Os autores haviam cuidado de tudo! Às seis da tarde, quando o sol escoava seus últimos raios avermelhados por entre os picos cobertos por neves eternas dos Cárpatos, Richmond e Harmony iniciaram a missa da ressurreição. Após a consagração dos pontos cardeais aos espíritos da terra, depois que os signos mágicos haviam sido traçados, leu-se a conjuração principal: “Per Adonai Eloim, Adonai Jeovah!Adonai Sabbaoth, Metrathon ou Aglamethon!Verbum Pythonicum, mysterlum salamandrae,Cenventus sylvorum, antra gnomorum, daemonia coelli god.Almosin, Gibor,Jehosua, Evam, Zariathnatmik!Veni, Veni, VeniEgo te provoco!Ego te provoco!In domine meum!VeniVeniVeni!” (2) Primeiro foram as velas que se apagaram sem que houvesse vento algum, depois as dobradiças das portas estalaram sem que ninguém as manipulasse. Os livros das estantes, então, saltaram de seus lugares e, espalhados no chão, se abriam e fechavam sozinhos. Lá fora, a noite provinha o ar de sons lamentosos; de gemidos de um quase prazer bestial. Eram como o frenesi de uma multidão cujas vozes se espalhavam pelas florestas e montanhas geladas. No interior da Câmara dos Tormentos, Richmond e Harmony presenciaram o ressurgir do mito. O nascimento de uma nova era livre. De súbito, a coisa em cima da pedra negra abriu os olhos. E seu corpo foi percorrido por violentos espasmos. No ambiente espalhou-se um forte odor de raiz de mandrágora em meio a densa fumaça azul esverdeada e ouviu-se o som de ossos se partindo quando o ressurrecto tentou se erguer. E ele, o último cavalheiro das trevas, olhando no fundo das almas de seus renovadores, falou, e sua voz era a de todos os irmãos juntos: “Tu lestes bem nossos ensinamentos!” E enquanto falava se dirigia a Harmony. Depois, encarando com seu rosto retorcido a massa trêmula em que se tornara Albertus Richmond, disse: “Tu, não temas! Não há razão para os teus temores!”. E continuou: “Temo eu, pois esta algazarra que vem lá de fora me perturba deveras. O que são, pois, estes gritos, estes risos, estas exclamações?” Neste momento o pior medo, o horror mais desmesurado, se apossou do coração de Richmond. Não havia meios de prever a reação do ressurrecto à segunda parte do trabalho de Harmony. O que fizeram era para toda a humanidade, mas não se poderia saber se a coisa iria aprovar. Assim, a única ação cabível aos dois mortais mais completamente tomados pelo poder da literatura das sombras, era abrir de uma vez a enorme janela que dava para a paisagem fria do lado de fora. Num pulo, correram a destrancar e retirar as travas que haviam mantido no escuro aquele quarto por mais de vinte anos. Em menos de trinta segundos as duas partes pesadas do janelão se abriram deixando entrar uma rajada de vento frio que espanou para o ar toda a poeira de muitos e muitos anos. Junto com o vento o som dos gritos de êxtase invadiu os cantos do velho castelo e a coisa que era toda a Irmandade das Sombras levantou-se de seu leito de mármore. Seus velhos ossos estalavam depois de décadas de inércia. E os sons continuaram pela noite. Repercutindo pelos vales e bosques ao luar. Era um som portentoso, nítido, próximo. Quando o ressurecto alcançou a sacada, a visão que teve o encheu do mais puro e indescritível deleite. Lá, cobrindo toda a extensão visível da terra, mergulhando em direção ao horizonte escuro como um enxame pululante interminável, estavam milhões de pessoas. E elas traziam consigo artefatos luminosos que brilhavam na escuridão. A coisa que era a Irmandade virou-se para Richmond e Harmony mas não precisou falar. “Eis aí, mestre! Teus fãs de todo o mundo que vieram celebrar este vosso renascimento. Eu mesmo, e meu amigo, chamamos e convencemos cada um deles a estar aqui nesta noite. Eles são milhões, e o início do teu reino!” Disse Harmony e seus olhos estavam cheios de lágrimas. “Vê Mestre!” Disse Richmond vencendo o medo em face da emoção. “Cada um trás papel e caneta. Eles querem ouvir o início da nova estória! Fala a eles!” Então a Irmandade das Sombras avançou mais para fora da janela até um ponto em que já quase se debruçava para o ar. E do umbral ouviu e viu a maior ovação que as forças do mundo já testemunharam. Com um sorriso no rosto ergueu os braços e, depois que a multidão fez silêncio, começou a escrita de uma nova era.

(1) - “Im Reich Der Farbtöne” = No Reino Das Sombras (N. do E.)
(2) - Ritual de invocação retirado do livro \"O caso de Charles Dexter Ward\" de Howard Phillips Lovecraft que por sua vez o adaptou ao seu conto extraindo-o da obra \"Dogma e ritual da alta magia\" do ocultista francês Elifas Levi. (N. do E.)

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Esta é minha singela homenagem para o dia do aniversário deste grupo do qual tenho a honra de participar. Agradeço por todos vocês terem um dia entrado em minha vida, ainda que virtualmente.Alguns membros não foram citados formalmente por este texto mas isso não diminui, de forma nenhuma, sua importância perante o grupo. Todos, como foi visto, somos um só! Henry Evaristo